"Deixei de ter passado ou futuro, somente existia. A pouco e pouco fui
perdendo a noção do corpo e a minha mente deslizava por águas calmas e seguras.
Somente um eu desconhecido que parecia que estava a reencontrar-se, cheia de
nada, cheia de tudo, um complemento da existência. O espaço perdera o seu
significado, os pensamentos eram ruídos, sentir, vento, calor, frio, a Deusa
que me acarinhava e sorria. Pedras saltitando num lago, uma folha a mexer-se
com a brisa, o suave cantar das ondas do mar, o chilrear de um pássaro. O
início e o fim do mundo numa dança intemporal. Pó, eu era um grão tão pequeno
dentro da grandiosidade existente, mas ao mesmo tempo abrangia como se fosse
possível tocar um pouco por todo o lado.
Já não era eu, era de novo pequena, num descampado, uma trovoada intensa
sobre mim, cheia de medo a gritar, eu de novo adulta. O tambor ritmado, depois,
um espaço subitamente silencioso, somente uma luz difusa e nada mais. Nada
mais. Repousei.
Peter encaminhou-me de novo para a carrinha, abriu a porta, deixou que
entrasse e entrou também. A minha mente ainda girava com as sensações da noite,
mas Peter começou levemente a acariciar-me e a murmurar palavras encantadas que
começaram a sossegar-me. Acariciou os meus cabelos ao de leve enquanto, com a
outra mão desenvencilhava-se das roupas que estava a usar. Quando mais nenhuma
restava olhou-me fixamente e sempre, sempre murmurando, foi-me acariciando até
que o meu corpo começou a ter espasmos de antecipação.
- Hoje é a noite em que os Deuses se unem na grande dança que são os ciclos
de vida. Hoje é a noite em que a noite vai-se sobrepor à luz, o feminino vai
imperar sobre o masculino e eu serei o teu consorte."