[Dali]
A casa em obras, os pedreiros, o eletricista, os homens das
janelas, todos vieram no mesmo dia. Lá em baixo o barulho de paredes a irem
abaixo, de instrumentos barulhentos, pó, pedras, um caos que está a implicar
comigo. Deito-me debaixo do édredon
tentando fugir, a cabeça lateja, o meu gato aconchega-se ao meu corpo, a
divisão entre tudo acabado e o sossego. Acabo por sair da cama, desço, estou a
mais, subo, sento-me, tento ouvir música e afastar a mente disto, desta confusão
que parece não ter fim. A pilha de folhas por corrigir continua ao meu lado, os
erros acumulados, e hoje não tenho concentração.
São todos simpáticos, os pedreiros, o eletricista, os homens
das janelas. Não conheço todos os nomes, a minha memória perde-se, mas já me
chamam pelo nome.
- Ó D. Teresa, vamos desligar a eletricidade.
- Ó D. Teresa, dá-me um café?
A casa está um caos como acontece quando há obras, não sei
onde ponho as coisas; descanso o olhar nas oliveiras que me rodeiam e espero
sempre não ter de ir à cidade abastecer-me, não quero ver mais gente. A minha
civilização concentra-se neste portátil, num telemóvel e basta-me. Basta
cinquenta anos de capital, de gente apressada, de gente com expressão triste e
olheiras no rosto como provavelmente também eu andei.