quarta-feira, 16 de outubro de 2019




Um pássaro acordou-me, pensei que era um rouxinol, mas era um verdilhão. Mal os conheço, mas ele insistiu em apresentar-se, tudo isto antes de beber o café da manhã. “Anda, está sol”, disse-me, “anda, vem respirar o ar da manhã, quando todas as cores vibram e os pinheiros mansos falam entre si. “Não, não posso, tenho tanto para fazer!”, tentei fazer-lhe ver. Mas ele bicou na janela, saltou entre uma pata e outra expressando o seu espanto, a natureza no mundo e o meu mundo fechado entre paredes.
Resolvi não hesitar e saí atrás dele que voou para longe. Mal o alcançava, custava-me correr daquele modo e comecei a pensar na minha sensatez. Até que vi homens de serras elétricas prontos para derrubarem pinheiros mansos, prontos para matarem e aniquilarem. Numa fúria aumentei o meu ritmo, atirei-me a um que num gesto mandou-me ao chão.
“Quem pensas que és para nos impedires?”
O verdilhão estava pousado num ramo e eu no chão, eram três e eu não era ninguém.
“Não sou ninguém, mas não ousais nem ferir porque tereis de me matar para o fazer.”
Eles riram-se, ligaram as motosserras e derrubaram uma a uma, três árvores enquanto me empurravam.
Vieram os camiões, vieram todos os outros homens e eu impotente, o verdilhão pousou no meu ombro e bicou a minha orelha.
“Hoje não,” segredou-me, “talvez nunca. Mas vistes a manhã.”

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