quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Rodo em torno de mim
- Tenho esta oportunidade,
serei seiva, folha caule,
não retornarei.

domingo, 18 de novembro de 2018

Criança-mulher,
passos imprecisos,
caminhos tão mal definidos
e no regaço, um mar de folhas caídas.

Foi o espaço, o tempo calado,
as palavras vãs escutadas
e todos os absurdos espalhados,
os anos dos esforços inúteis.

Envelhece a alma, mata o corpo,
consome a mente, é-se morto.
Ecos ecos ecos
grita a alma, termina o tormento.

Acabou o jogo?
Grito de agonia,
rendem-se as mãos,
é o início da loucura,
o começo do fim de tudo
onde os deuses observam
e o fado ri, por fim.

Escorro o tempo pelas notas musicais
que atravessam as memórias
indiferentes às marcas cravadas
nas pedras que me rodeiam.

Fui em tempos criança
num corpo crescido,
alheia às estações,
absorta nas folhas caídas.

Hoje não tenho aquela casa,
tão pouco as paredes caiadas,
jardim sem ervas,
espaço sem espaço.

Escorrem lágrimas sem água,
a dor que se dilui nos degraus toscos
da casa que não voltarei,
onde não estarás de novo,
agora para sempre.

sábado, 10 de novembro de 2018

Cansada


"Estou cansada,
cansada das imagens enroladas nas teias,
dos padrões interrompidos e corrompidos.
Das ruas escuras,
da fadiga das ondas sobre as rochas,
do passo à frente sem chão definido.

Onde estão os aromas a manhã,
vivos e arrojados,
relembrando que as árvores são sementes resistentes,
que a luz irrompe da negrura do espaço vazio?

Um toque,
uma valsa,
um desígnio.
Espaço preenchido pela mão cheia.
Letras dançantes cantando histórias.

Essas, as que pressentimos"

in "A fadiga das ondas", Teresa Durães

terça-feira, 23 de outubro de 2018

Para ti, L.



"Sei que o sonho que tive era mais do que uma mera ilusão - tu estavas lá, à minha espera, como sempres estás. Nas minhas mãos, flores silvestres para te dar. Sempre foste contra as flores aprisionadas num jardim bem cuidado, não passam de mero adorno, sem alma presente.
Como sempre, fiquei calada ao teu lado, respirando apenas o teu odor (tão próprio) que me faz e traz todas as lembranças de nós. Das palavras que te queria dizer, nenhuma saiu. Ficaram envoltas na minha mortalidade tão aquém do tempo que te amo. Limitamo-nos a estar juntos onde fluíam todas as emoções. Juntei pedacinhos de paus, pedrinhas pequenas só para refrear o que te queria dizer. Não sei porque sou assim, sem verbos nem melodias, mãos encolhidas e receios tão antigos. Tu vais muito mais além, a tua sabedoria ainda me inquieta como se eu fosse tão frágil para necessitar sempre do teu amparo. 
Trago-te comigo em todas as viagens do quotidiano, na vela que acendo para que saibas o caminho até mim, no bosque onde nos vemos todas as noites. Nas pedras gigantes onde adormeço nos teus olhos.
Há tantos anos que nos amamos, quantos ainda temos para amar. Envio-te um beijo numa folha perdida. Será mais um recomeço da minha entrega.

Teresa Durães"


in "Três quartos de um amor", Chiado Editora

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Cai a primeira chuva
varrendo da memória
os dias soalheiros.

Talvez encontre
o meu primeiro abraço
repleto de folhas caídas
entre raízes estendidas.

Talvez o primeiro beijo
entre luz oblíqua,
enquanto a chuva espera
e a floresta escuta.

Talvez amanhã seja o dia
onde mãos se conheçam
e reconheçam as carícias.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Vence a dor sobre o corpo,
dobra a coluna em sofrimento,
pede a alma discernimento,
alcança pouca paz em consentimento.

Dias que passam,
ventos que sopram,
corre a água,
nada volta.

Fragilidade na brisa,
marés indevidas
Rasga a pele, o osso, a carne,
rasga o sopro da vida.
Rasga prados de flores,
mantém tronco erguido.

sábado, 1 de setembro de 2018

Acendi uma vela
dizendo-te adeus:
outrora rir-te-ias de mim,
desprezarias rituais,
a minha ligação ao mundo.

Outrora estarias aqui,
conversarias sobre tudo,
descreverias espaços onde nunca fui.

Hoje és uma lembrança
que ainda dói.

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Estendo-te a minha mão
pela última vez:
é a tua última partida
e já choro por ti.


quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Pousavas a voz num galho
enquanto aninhava no calor
da tua curta distância.
Éramos o vento, o entrelaçar
das folhas viçosas da primavera,
a paz do chilrear dos pássaros.

Hoje preciso de novo te procurar
entre caminhos mal desenhados,
espaços antigos de magia
onde nos víamos e amávamos,
onde éramos espaço consagrado.



quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Procurei-te mas não te sei,
abandonei-te em estranhas paragens
que de mim não fez nada.
Diz-me onde estás
que de estrada farei a minha passagem
Diz-me apenas, que continuo a tua amada.


Voaram pássaros na minha janela
despedindo-se da paisagem conhecida.
Chegou a hora da ida,
larguem ninhos, libertem raízes,
soltem flores em campos floridos,
chamem as vozes das despedidas
que o meu corpo se vai por fim
gritando apelos de vida
encontrando enigmas
mas sempre mergulhando em sucalcos erguidos

sábado, 4 de agosto de 2018

Veio de novo um eco antigo
como se solucionasse
todos os sonhos perdidos.



Caiu a pedra no charco negro,
fugiram as rãs com medo.

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Cobre a sombra os braços
que tentam ter em suas mãos
as madrugadas veranis
onde são retidas todas as conchas
que trazem histórias de marinheiros perdidos.

Ergue-se a voz, fala o profeta,
naus foram lançadas,
pede-se a coragem.

Ergue-se a voz, tenho areia retida,
passado conquistado, maresia.
Tenho sonhos antigos, tenho a brisa.


segunda-feira, 23 de julho de 2018

Tocando em uníssono,
enquanto a brisa nos lembra
a distância entre o teu verbo,
onde estás? Frase esquecida.

Dizem os Deuses,
a fonte foi erguida,
venha o sal,
a boca dorida.

Dizem os Deuses,
o destino foi cumprido.

Rolem pedras, cumprem promessas,
esta é a Era.

De tanto te querer
Libertei as asas
Perdi penas
Alcancei-te
Amei

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Dá-me a mão agora que me vi
cruamente e tão desnecessariamente.
Dá-me a mão e não te vás
agora que choro por mim.

Não te vás e me deixes aqui,
dá-me a mão e fica por mim.
Dói e não me quero assim.
Fica comigo, diz que sim.

Dou passos cuidados. As pedras cobertas de musgo dão passagem. As árvores centenárias escondem os raios do sol. Os pássaros são os únicos a quebrar o silêncio, só a brisa desafia com o murmurar das folhas. Quero serenidade, dou três passos, quero paz, dou cinco passos, quero ser eu, e dou mais sete passos.
Uma voz suplicou
pensando ser ouvida
por quem foi nascida.
Repetiu-se o ciclo
entre pedir e dar
e de novo perdeu.

segunda-feira, 16 de julho de 2018

As estrelas há muito ocupam espaço no céu. Ao longe, o som de animais noturnos.

- Nunca percebi porque dizem que a noite é silenciosa, dizia uma amiga minha enquanto fumávamos calmamente um cigarro.

Não está calor mas é verão. Já choveu, sim. Aqui não há animais noturnos nem campo nem árvores mas é verão e é preciso ir à praia e conviver e rir e lembrar a toda a hora que é verão e no verão nada é sério.

domingo, 1 de julho de 2018

Ontem rezei ao amanhecer. Não sei a que Deus apelei, sei que te queria sentir. Mas o espaço devolveu-me o cantar triste da solidão.

sábado, 23 de junho de 2018

O sol aquecia quando te procurei nas ondas. Sei que estarias lá envolvendo-me no primeiro mergulho do ano. O sal na boca, a dormência no corpo e tu, tu, ao meu lado aquecendo palavras num sopro profundo. Tu, sempre ali, mostrando-me movimentos que atingem a lua em dias de luz.

E dei-te a mão, estendi-ta em rendição.


Hoje soprou vento do sul. Sabes que amanhã irá chover. As folhas dos carvalhos sorverão a água que escorrerá e alimentará as raízes.

Também sabes que a chuva não esconderá as lágrimas reprimidas.

Ontem quis ser sol, calor, brilho. Nunca gostei de ter olhos fixos em mim mas levantei os braços e agradeci a minha vida.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

A sala caiada. A noite, coberta. Não estavas lá - era o tempo para mim. Uma harmónica preenchia o vazio das paredes. As paredes, grossas e antigas. A ausência de flores como se não existisse lugares bravios.

Vivi acordes nunca antes experimentados tendo sempre a esperança que de longe me tivesses ouvido. Preenchi as paredes, pintei o caminho para mim e desejei que as estrelas iluminassem o estreito carreiro entre nós.


Sei que as tuas palavras eram para serem um bálsamo. Não foram, foram atiradas para o vento que não alcanço. Tolhi o corpo sentindo-me atraiçoada. Todos os invernos diluíram no mar para serem esquecidos.

Tanto tempo que te vivi.

Hoje tenho uma vela que não acendo. Restam-me recordações que deslizam nos meus dedos sem querer recordar.
Tantas as noites em que estivemos sós, perdurando confidências e carícias. As estrelas iluminavam-nos tornando a noite quente um refúgio para os sentidos. Estendemos o carinho pela a areia branca onde nos sentávamos. Vi o céu, conheci o amor, ouvi o mar e soube que a espuma branca apagava os nossos passos na areia. Eras um refúgio onde descansei.


Ontem vi-te após tantos anos. Sei que procuravas na minha expressão toda a comunhão que tivemos. Contudo, como poderia estender a mão tal ramo que procura o sol? Os meus dedos não são galhos, o meu corpo, tronco. E a minha vida deixou de ser natureza.


Recordas-te da minha infância? Eras a voz da minha imaginação como se fosse possível amar-te sem te encontrar. Cresci vendo-te desenhado nos cadernos de capa preta onde os meus mistérios repousavam. Mais tarde rasguei-os em fúria, arrebatando esses anos longínquos. Queria ser livre, precisava de matar o passado.

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Foram intensos os dias que passamos juntos, tu, a brisa, eu, um caule desprotegido. Mas amamo-nos, vivemo-nos como se fosse possível parar o tempo. Mas envelheci, a crença de outrora vacilou com o novo mar que a costa desconhece. Fosses o meu semi-deus poderíamos prolongar os dias, estendê-los numa suave areia. Porque a minha humanidade não consegue te reter.

Sei de um dia em que o brilho do sol se projetará no mar de verão e tu recordarás as minhas mãos.
Consegui pegar na tua mão. Não te sei dizer como tive coragem. Segurei-a até perder a razão de a reter.

Em ti crescem flores, estendem-se ramos e no teu abraço encontro as melodias a crescerem.

in "O sopro", Teresa Durães
Conheci-te criança. Ombros fortes, olhos castanhos, cabelo rebelde. Ficaste nos livros de infância, rascunhos em voz destemida. E cresci.

Renasci entre as árvores de Sintra, escalei pedras imutáveis e encontrei-te de novo.

Foste porto de encontro, água macia, fogo quente. E vivi-te intensamente.

in "O sopro", Teresa Durães
Hoje soprei-te flores silvestres, odor a maré baixa, casca roubada a um tronco de árvore. E tu vieste, vieste como sempre te vi. Olhos escuros, capa a cobrir-te o rosto.

Hoje quis-te aqui, construí um círculo em volta das flores e esperei.

in "O sopro", Teresa Durães



segunda-feira, 11 de junho de 2018

Ouço o vento e sei onde quero estar. Ao longe o mar revela a sua fúria, há humidade por todo o lado. Há presença, palavras firmes de uma fé antiga.

Não existe força maior do que o apelo ao nosso fado. Onde guitarras soltam acordes de saudade.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

Um dia anunciaste a tua vinda: preparei o jantar como se fosse mais um dia na nossa vida.
"Não reconheceste o voo da águia, fugiste, por onde andas?

Voltei a sonhar furiosamente: o ar carregado de sal, as ondas impediosas, o vento a gritar.

"Não serei uma onda perdida na margem de uma praia qualquer. Soprarei para longe a espuma das águas revoltas,

quinta-feira, 7 de junho de 2018

-Quem és? - nunca respondeste. Sorrias como se as flores silvestre que me deste fossem todas as respostas. Liberdade, diziam os teus olhos. Um voo alto. Um sopro primaveril. A música das folhas de um castanheiro, quando a brisa acaricia a copa.

in "O sopro", Teresa Durães

segunda-feira, 4 de junho de 2018

Não era tarde quando te encontrei. As flores selvagens persistiam em adocicar o ar. Estávamos somente os dois. Nós e as árvores centenárias. E fontes de energia no ar.
-  Quem és?
Não houve resposta.

"- Dá cá a chave!
- Dá-me a chave se faz favor - e o gigante de pedra abriu a mão e deu-lhe a chave"

Outrora confiava, disse-te. Outrora era outra, mão dada com a fantasia.

- Posso ter a chave?

in "O sopro", Teresa Durães

sábado, 2 de junho de 2018

Abraço-te intensamente. A noite está no seu término, em breve serás apenas uma recordação. Deito-me espreitando o teto. Talvez já tenha vivido muitas vidas diferentes e chegou a hora de vestir uma pele. Talvez continue desapegada. Talvez os meus passos já tenham escolhido caminho na direção de um novo vento.

in "O sopro", Teresa Durães

quarta-feira, 30 de maio de 2018

Escuto as tuas mãos,
dás-me flores bravias,
um novo dia.
Perdi o caminho escolhido enquanto fui nascente, água corrente. Queria ter visto o teu rosto na margem adjacente. Roubo um minuto de fantasia e entrego-me aos teus braços. Conta-me mentiras, sussurra melodias.
Segue o seguinte, amostra do existente, estamos decadentes, varremos ruas e continua a dormência.

Sobrevive, existe, completa-te. Raiva resistente. Vai em frente. Só, destino ausente. Mas vai em frente.

terça-feira, 29 de maio de 2018

Acreditei, sonhando espuma do mar, que estavas para mim como o sal das gotas de água que o oceano espalha. Errei, fui levada pelas ondas que afinal não são tuas.

Levantei-me, gelada, sentindo a violência de todas as manhãs. O abraço da solidão sufocou as paredes brancas ainda para serem preenchidas.

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Ontem era o dia de todas as coisas. Ergui os braços abraçando ideias perdidas. Fui cor, água escondida, uma ave altiva. Fui tantas vidas.

Sonhei. Onde te via distante, corpo acelerado, toque nunca consumado.

Quando o piano tocava, esvoaçava tentando encontrar-te. Foste notas, melodias, semi-breves na minha vida.

Resta-me um espaço perdido onde tento encontrar um qualquer horizonte.

Lentamente estendo as asas
- há no movimento a suavidade
do nascer do sol no quente verão.
Sei-me perdida com a ausência
das vozes de árvores antigas.
Entrego-me ao meu fado
pedindo guitarras portuguesas.

sexta-feira, 18 de maio de 2018

Toco suavemente nas mãos
- desapareceram os heróis antigos,
a força do destino,
a canção do Início.

Lenta a paisagem
por onde sobrevoo,
tenho liberdade no voo,
o corpo tolhido pelo assombro.

Tenho fé antiga.
Olho-te como nunca o tinha feito. Tens os contornos que me abraçam na noite, a voz calma que me sossega,o sorriso quente que indicam uma longa sabedoria. Penso-te tanto, nas vezes que me aninhava no teu abraço deixando que todas as amarguras duras esvoaçassem levemente. Da partilha dos meus sonhos, no anseio da tua segurança. Sim, sonhei também com segurança,  como se em todos os caminhos estivesses lá. Sonhei-a acreditando que me a estendias. Devia ter percebido que apenas não podias. E senti-me traída .

terça-feira, 13 de março de 2018

Saudei a distância
como se fosse água
em tempo de privação.

Queria um caminho,
passos em contínuo,
tempo de sublimação.

Sobra-me um passado
que se esconde nas esquinas,
voraz em todas as medidas
deixando as flores enperdenidas.

domingo, 4 de fevereiro de 2018

Sobrou na mesa a tua ausência
carregada da distância
entre as mãos que não se cruzaram.
"É a vida", dizem
imagem integrável nos prados,
na ausência de novos sóis.

"É a vida", dizem
esquecendo as promessas escondidas.

Não, não é a vida,
criando um fado
nunca a ser vivido.

Não, não sou a vida
que te prometeram.

Não,
somente sozinha
no mar que não se deu.



terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Fui ao mar encontrar o teu amor,
água salgada que fere os meus lábios,
desenhei numa concha o meu coração
pensando que virias ao meu encontro.
Não vieste nessa madrugada,
preenchi a minha alma abandonada
com restos de castelos erguidos
alheios aos meus sentidos.
Vento da minha memória
não tragas mais recordações
desse passado malfadado
gemido de guitarra que não é tocada.