terça-feira, 19 de maio de 2020





Fumo um cigarro. A vida não é uma espera, mas eu espero, espero o vazio que antecede a explosão. Tudo menos o corpo é eterno. O tempo dos Deuses quase findou mesmo talhando as suas 7 espadas acima.
Sei que estás comigo. Não no bosque, na clareira onde nos sentávamos à volta da fogueira, tu de capuz, sorridente, enquanto eu apanho lenha para não deixar o lume esmorecer. Estás nas palavras que escrevo, nos dedos que acendem uma vela, nas paredes brancas que falam comigo.
Primeiro foi a escuridão onde divagavas em espírito, depois encontrei-te onde te vivi. Duvidei-te e separei-me. Tu nunca o fizeste. Porque erramos tanto? Forjam os Deuses as suas 7 espadas para desbravar a nossa existência, criam os cumes para podermos alcançar mais longe, entregam-nos a sua magia para aliviar as nossas vidas.
Desbaratei tudo. Tu, os cumes, a magia. As árvores, os prados, a brisa. As marés. Como preencher-me de novo, arrecadar as verdades e livrar-me do lastro que é a nossa contínua existência? Voltar a reconhecer as 7 espadas acima que os Deuses ainda empunham silenciosamente na nossa presença, correr feliz nas florestas barulhentas, explorar grutas onde se escondem donzelas divinas, voltar a ser uno com as estrelas que escondem histórias de amores perdidos.
Agarro a minha cadela. Temos tanto para dar uma à outra. Temos esta vida, temos todas as vidas juntas, todos os universos paralelos e os que hão-de vir. Como tu, connosco, não aqui, para além de todos os ventos, das raízes das florestas, das serras onde vemos os rios a brincar nos vales escondidos, longe das bolotas caídas das azinheiras e dos ouriços das castanhas que doem nos dedos.
Quero. Despojar-me deste corpo incómodo quando a lua se aproximar, largar o espírito 7 vezes acima das coisas vivas, reviver os Deuses antigos e viver a noite onde te encontras para mim.

Teresa Durães in "7 espadas acima", gratuito para download na loja Kobo.com

1 comentário:

  1. Para aperitivo já é muito. Bastava "Quero" dito para rasgar um campo por semear.
    E, mais, nada se perde, Teresa.

    A sorte é a procura.
    Beijo.

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