Só um gesto, uma palavra e de repente ela não foi embora e
sempre esteve comigo mesmo no tempo do frio, quando a janela aberta deixava-o entrar pela noite e os animais noturnos trocavam impressões entre si. Não, nessa
altura estavas distante a aprender que nos tínhamos separado, tu explorando a
tua essência enquanto o meu corpo renascia num ambiente que não era o seu e
todos os dias aprendia e aprendia tanto sobre si. O bom, o mau. Tudo, essa
grande dimensão que é voltar a viver, voltar a ser, poder voar e o fazer.
"O fantástico não está fora do real, mas no sítio do real que de tão visível não se vê.", Vergílio Ferreira
quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020
segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020
sábado, 15 de fevereiro de 2020
[Klee]
Um dia um dos Deuses dar-nos-á as mãos e retirar-nos-á uma parte de nós mesmos entregando-nos um segredo escondido, tão escondido que sementeiras passarão sem que as flores apareçam. Mas desse segredo virá uma outra paisagem, tão diferente, tão completa como a primeira e tão difícil de pintar como todas elas o são.
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020
[Dali]
Não sei onde se fecham as portas, sei de infernos que
subitamente aparecem, mas também se vão. Sei de flores que crescem, botões que
resistem, sei de um céu que permanece mesmo nas alturas em que os meus olhos
escureciam e não acreditavam que para além das nuvens existem rastos de raios.
Nem sempre as linhas são certas e certo é o presente que nos engana, não há fio
de prumo que nos leve de bruços, somente descidas tempestuosas e a espera
prolonga-se até o céu clarear mesmo que demore anos a acontecer.
terça-feira, 4 de fevereiro de 2020
[Dali]
Onde as flores despontam, onde as ervas vingam, onde as
oliveiras respiram encontro-te uma e outra vez. Tem os olhos escondidos por
entre as folhas prateadas, os ramos finos que escondem o teu corpo. Vigias-me
sorrateiramente como amante sempre presente, sinto o teu calor na pequena brisa
que vem ao meu encontro. Não preciso de te ver para sentir as tuas mãos nas
minhas, a pele retém a memória, os lábios estão quentes e os meus passos são
apressados sempre que percorro o caminho porque sei que lá estarás.
À noite, quando as estrelas estão escondidas nas brumas do
inverno, quando a minha vela acende por ti, a chama treme ligeiramente. São as
paredes brancas a anunciar a tua sombra.
segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020
“Desta vez é certo”, dizia um dos poemas do livro “365
Histórias de Encantar”,
- Desta vez é certo! – Enquanto abria pela primeira vez a
caixa do berbequim e tentava montar o punho auxiliar.
Para que serviria aquela palheta amarela? Não me parecia que
a broca encaixasse na ranhura.
Abro o manual, há sempre um manual complicado, nada explícito,
sem bonecada necessária com as
instruções passo a passo como eu preciso. Não, não mostra como se põe o punho e
quando dou por mim está tudo desmontado. Olho de novo para aquele instrumento
estranho, não pode ser difícil, tenho visto o meu amigo a utilizar aquilo
tantas vezes e nunca o vi meia hora à volta de um berbequim.
Olho de novo, será tipo lego? Tento encaixar o orifício com
cuidado pela parte da frente, vá lá, entrou, agora é só montar tudo de novo e
rezar para que não sobrem peças. Só falta encarar a parede, a bucha e o
parafuso.
A broca sabia qual era, não estava tão mal quanto pensava. Faço
um ponto na parede, ligo aquela coisa barulhenta quando apercebo-me que tem
duas velocidades. Afinal não li o manual como deve ser. Furo, furo, a broca
fica na parede, tiro-a, coloco-a de novo, furo até que tento pôr a bucha com a
ajuda de um martelo.
- Uma já estraguei. – Resmungo com os meus botões enquanto
furo um pouco mais, coloco outra e dou-lhe uma martelada. A seguir o parafuso.
Admiro a minha obra de arte maravilhada. Ainda bem que a
parede vai ser pintada porque devia ter colocado um pano quando usei o martelo.